segunda-feira, 2 de março de 2009

O QUE É DIALÓGICO ?



O termo dialógico adotado por este blog refere-se a uma disposição do homem de estar aberto ao diálogo para-com-seu-próprio-mundo; aberto ao encontro para-com-um-outro.


Dialógico, aqui, tem inspiração na concepção oferecida por Martin Buber. E para que nos torne clara esta concepção, devemos passar às palavras do próprio Martin Buber.


Em um das passagens de seu livro “Do diálogo ao dialógico”, este existencialista religioso nos diz: “É válido distinguir três maneiras pelas quais podemos perceber nosso mundo (e não estou me referindo a um objeto científico).”


O primeiro é o observar, e prossegue em sua exposição: “O observador: concentrado em gravar na sua mente o que observa....Se empenha em desenhar tantos “traços” quanto possível. O objeto (de relação) é constituído de traços e sabe-se o que está por trás de cada um deles....assimila sempre de imediato as novas variações...e ele permanece utilizável”


Em seguida nos fala do contemplar: “O contemplador não está absolutamente concentrado. Ele se coloca numa posição que lhe permite ver o objeto (de relação) livremente e espera despreocupado aquilo que a ele se apresentará. Só no começo pode ser governado pela intenção, tudo o que se segue é involuntário. ... não é temeroso de esquecer alguma coisa. (“esquecer” é bom diz ele). Não impõe tarefas à memória...não recolhe como faz o observador.”


Estas distintas disposições não se distinguem tanto quanto, a primeira vista, pode nos parecer, pois: “O observador e o contemplador têm em comum o fato de terem a mesma posição: o desejo de perceber – o homem que vive diante dos olhos, tem para ele o objeto separado dele próprio e de sua vida pessoal, que justamente e apenas por isso pode [o objeto] ser percebido de “uma certa maneira”. O que eles experienciam...não exige deles nenhuma ação e nem lhes impõe destino algum; pelo contrário, tudo se passa nos campos distantes (de si mesmo).”


Sendo assim, Buber nos diz que tudo se passa de uma outra maneira quando: “...nos dispomos àquilo que se oferece, sem dizer ao objeto (de relação) o que ele deve nos dizer. É aquela “alguma coisa” que o diz.”.


“Dizer”, segundo este grande mestre, não á uma metáfora, mas sim um compartilhamento íntimo do conhecimento: “O efeito de ter sido o receptor deste dizer é totalmente diferente do efeito de observar e de contemplar...não se pode retratar, nem descrever. Tentá-lo fazer já seria o fim do “dizer”, pois não se pode tomá-lo como um objeto distante de si mesmo. E, talvez tenha que se contentar apenas em aceitar aquilo que é oferecido, ou dito...Nesta relação, tudo que temos que fazer é encarregarmos-nos de responder. E esta resposta chamemos de “tomada de conhecimento íntimo”.


De uma outra maneira poderíamos falar de um conhecer a si através do objeto (de relação) e conhecer o objeto em si, em uma relação íntima. E por isso Buber ressalta que: “Os limites de possibilidade do dialógico são os limites de possibilidade da tomada de conhecimento íntimo.”


Portanto, “O dialógico não se limita ao tráfego dos homens entre si; ele é um comportamento dos homens um-para-com-o-outro...assim sendo, ... há um elemento indissolúvel: a reciprocidade da ação interior.” E prossegue dizendo que: “O homem disposto à abertura dialógica deve estar voltado para seu mundo, e com ele se relacionar intimamente, não inportando com que medida de atividade, ou mesmo consciência de atividade.”


Buber nos alerta para a sutileza e dificuldade de tal disposição: “Cada um de nós está preso a uma couraça, cuja tarefa é “proteger” e repelir [aquilo que se nos oferece ]...preso numa couraça, que graças a força do hábito, logo deixamos de sentir.” E prossegue :“Aos instantes que atravessam a couraça à receptividade da alma, logo dizemos: o que aconteceu? Não era algo semelhante ao que acontece todos os dias? Os eventos do mundo são palavras que me são dirigidas, mas só quando os esterilizamos é que posso compreender...como uma parte dos evento do mundo, que não me diz respeito...”


A disposição dialógica é refreada por nós mesmos, pois nossa cultura ocidental não é acostumada aos desencontros e incertezas. Nós ocidentais precisamos estar sempre conscientes daquilo que nos acontece, só que no entanto, este “estar consciente” é um distanciamento do objeto (de relação):


“Mas para aquilo que me toca intimamente e cria-se um estranhamento, logo recorre-se à companhia de adivinhos...para buscar orientar-me: O que é isto? O que tenho que fazer? ...E a consulta tem que ser “para sempre”, com regras, leis, e certezas. Mas tudo isso é um grande falso saber.


“O verdadeiro conhecimento se dá quando cesso de consultar os dicionários. Pois o que me acontece diz algo a mim, e só em minha relação íntima é que este significado pode surgir”. E se não surgir, permanecerá até que a sua própria resposta tenha-se dado; não por ato de decisão, mas por ato de conhecimento íntimo.

Para finalizar este esclarecimento do que este blog entende por dialógico, é preciso dizer que o homem deve assumir sua responsabilidade perante o seu próprio mundo. E responsabilidade, como nos diz Buber: “É o responder àquilo que nos é oferecido, (e) que nos acontece.”

sugestão de leitura: EU e TU; Buber, Martin; editora centauro

Um comentário:

  1. É.. acabaram com o mistério no mundo ocidental....................................................................................... Ou não ....

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